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segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Rohter e a imprensa brasileira

Do site Comunique-se

Larry Rohter: "imprensa brasileira navega num mar de mediocridade, com ilhas de excelência"

Poucos dias após deixar o cargo de correspondente do New York Times no Brasil, Larry Rohter concedeu uma longa entrevista ao Estado de S. Paulo, publicada no domingo (19/08). Em um papo franco, Rohter mostra que gosta do País e de sua cultura, fala sobre os bastidores da matéria que quase causou sua expulsão e bate pesado na imprensa brasileira.

"Durante a ditadura eu admirava a imprensa brasileira. Ali existia um jornalismo que era vocação, não só carreira. A morte de Vladimir Herzog foi algo que me marcou. O próprio Estado, ao publicar trechos de 'Os Lusíadas', para resistir à censura, foi algo tocante. Jornalistas e empresas de comunicação até pagaram um preço alto por isso. Hoje em dia, as coisas são diferentes. Há jornalistas de gabarito, mas a imprensa brasileira navega num mar de mediocridade, com algumas ilhas de excelência", diz.

As críticas serão aprofundadas em um livro em que prepara sobre suas duas passagens no Brasil – além do NYT nos últimos oito anos, foi correspondente da Newsweek nos anos 70 e 80 –, que já tem título: "Arestas Insuspeitas". Licenciado do jornal, Rohter fica no País mais alguns meses para terminar a obra, e depois deverá seguir para China, onde pretende encerrar a carreira.

Expulsão

Sobre a reportagem que quase levou a sua deportação, Rohter acha que o presidente foi mal assessorado. "Difícil saber o que aconteceu no Palácio do Planalto naqueles dias, mas tudo indica que as coisas ficaram muito ruins pro meu lado. Só mudaram de curso quando o então senador Sérgio Cabral entrou com um habeas corpus a meu favor. Ali, e só ali, senti que, num eventual julgamento da questão, o Supremo, inteiro ou em boa parte, ficaria contra o governo. O ministro Márcio Thomaz Bastos (da Justiça) não tinha outra opção a não ser costurar um acordo", lembra.

O correspondente começou sua apuração pedindo uma entrevista ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "O secretário de imprensa, Ricardo Kotscho, não me recebeu. Falei com o número 2, Fábio Kerche. Apresentei minhas questões. Aguardei uma manifestação por dez dias e nada", detalha Rohter, guardando informações para o livro. "Até que aconteceu um fato, que vou revelar no livro, e voltei a fazer contato com o assessor. Disse-lhe: 'A coisa vai sair. Se vocês quiserem se manifestar é agora'. Ainda coloquei uma declaração transmitida pelo assessor na minha matéria. Mas jamais me receberam, jamais quiseram saber o que eu sabia", diz.

Com a matéria se tornando uma questão política, Rohter passou a tratar do assunto diretamente com a direção do jornal, por meio do editor-chefe, Bill Keller, e diz que o NYT esteve ao seu lado o tempo todo. "Não saí do País, o ombudsman não se manifestou, não houve pedido de desculpa do jornal, não houve carta ao governo, nada. Apenas um recurso para revogar a ordem de expulsão, medida legal, preparada por advogados brasileiros".

Rohter x Globo

O impacto da reportagem, segundo Rohter, foi amplificado pela mídia brasileira.
"Escrevi refletindo o ambiente: o presidente brasileiro tinha um hábito que o estaria prejudicando no exercício do poder. Isso eu não inventei! Mas setores da imprensa, liderados pelo jornal O Globo, ou melhor, pelas Organizações Globo, resolveram me atacar. Acho que há uma obsessão com o que sai no NYT. Matérias que fiz foram mal interpretadas, mal traduzidas, publicaram-se coisas que nunca disse, fico indignado. Por exemplo, escrever que eu disse que a Garota de Ipanema hoje é gorda? Que absurdo! Era um janeiro em que nada acontecia no Rio, então o jornal criou uma polêmica xenofóbica, baseada em mentiras", afirma.

Rohter segue dizendo que O Globo "desqualificou meu trabalho, sabendo que eu não faço fotos e nem estava com o fotógrafo quando ele capturou as imagens. O jornal também disse que o NYT publicou cinco fotos da série, quando usou apenas duas. E o nosso ombudsman acusou o erro do fotógrafo. Os critérios da imprensa americana são mais rigorosos que os critérios da imprensa brasileira".

O Estadão procurou Rodolfo Fernandes, diretor de redação do Globo, que sustenta que o jornal não tem obsessão pelo NYT, respeita seu padrão de qualidade, mas que isso não o impede de cometer erros. "Como no caso do presidente Lula, quando se baseou em fontes desqualificadas. No caso da 'Garota de Ipanema gorda', O Globo descobriu que era uma reportagem errada e o ombudsman do NYT pediu desculpas", diz Fernandes.

Uma informação pouco difundida, que Rohter comenta na entrevista, é que ele trabalhou para as Organizações Globo em Nova York no início da carreira. "Ajudava na área de música, comprava matérias de revistas americanas e fazia produção para o Fantástico, que estava nos primórdios".

"O que o senhor sabia e quando soube?"

Rohter relembra também sua primeira passagem pelo País, ainda como universitário, que o PT é o partido que mais se incomoda com as críticas e considera que a cobertura do acidente aéreo em São Paulo não está exagerada – "é sintoma de uma crise maior". Se pudesse reencontrar o presidente Lula, que conheceu em 1978 cobrindo as greves do ABC, Rohter faria uma pergunta que remete a outro escândalo político.

"Na comissão que investigou o escândalo Watergate, o senador Howard Baker repetia sempre a mesma pergunta em relação a Nixon: 'What did the president know and when did he know it?' É a questão fundamental. Pois eu perguntaria a Lula a mesma coisa em relação ao mensalão: 'Presidente, o que o senhor sabia e quando soube?'"

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