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terça-feira, 30 de outubro de 2007

Rogério Sganzerla, o livro


Por Estevão Garcia

Hoje, às 20h na Pizzaria Piola, que fica na Rua Paul Redfern 44, em Ipanema, acontecerá um evento imperdível: o lançamento do livro Rogério Sganzerla. Componente da série Encontros, realizada pela editora Azougue, o livro, organizado pela jornalista e roteirista Roberta Canuto reúne em 208 páginas algumas das mais importantes e históricas entrevistas que Rogério Sganzerla concedeu ao longo de sua trajetória. Optando seguir por uma ordem cronológica, Roberta inicia a coletânea com entrevistas realizadas em 1966 ("As promessas do tédio e da coragem", por Miram Alencar, e "Confissões de um cineasta zangado", por Orlando Fassoni) quando Rogério ainda trabalhava como crítico cinematográfico e tinha em seu currículo de diretor apenas o curta "Documentário". Segue a esse momento a repercussão ocasionada pela explosão da estréia de "O Bandido da Luz Vermelha", e é justamente aí onde encontramos alguns dos mais significativos achados do livro: as conversas entre Rogério e o crítico, cineasta e historiador Alex Viany. As três entrevistas realizadas por Alex Viany que podemos conferir no livro são "Sganzerla ataca de bandido", "Confissão e desafio de um bandido incômodo" e "O incômodo Sganzerla". Constatamos que nessas três matérias de Viany, o termo "bandido" e "incômodo" aparecem duas vezes e é exatamente desse modo como Saganzerla foi percebido pelos círculos do Cinema Novo na época do lançamento de seu primeiro longa. Viany, em seu papel de pesquisador do cinema brasileiro e historiador do movimento de renovação então em voga no país, coloca a equação Saganzerla/Cinema Novo como uma de suas principais preocupações. Viany pergunta a Rogério: "Como você se situa em relação ao movimento do Cinema Novo?".

A posição de cineasta isolado, boicotado e impedido de ter acesso aos meios de produção pelos burocratas do cinema brasileiro, que o próprio autor muitas vezes sublinhou e em certa medida propagou, é aqui rastreada a partir de sua possível origem. Ela pode ser entendida através de sua contundente crítica à fase do Cinema Novo em 68/ 69 que o fez declarar que "O dragão da maldade contra o santo guerreiro" era um "vexame" e que "Macunaíma" não passava de "um lixo". Essas declarações, entre outras fontes, aparecem na última entrevista de Viany que aparece no livro, publicada originalmente em "O Jornal", em 23/1/1970. Logo depois dessa, a compilação reproduz a famosa entrevista concedida por Rogério e Helena Ignez ao Pasquim e tornada pública em 5/2/1970. Na célebre e histórica "A mulher de todos e seu homem", Rogério dispara o tiro de misericórdia e desmancha qualquer resquício de gentileza com o Cinema Novo. O tom agressivo e incisivo de sua fala objetiva a total ruptura e o coloca como um elemento completamente a parte de qualquer "igreja" ou panelinha.

Das entrevistas dos anos 90, temos duas de grande importância histórica que se relacionam intimamente entre si. A primeira é "Belair, 20 anos depois", por Susana Schild, e a segunda, "Cinema com arte: Sganzerla e Bressane", por Alcino Leite Neto. Nas duas temos o encontro entre Sganzerla e Bressane, sendo que na primeira o livro optou por publicar apenas as falas de Sganzerla. Na segunda, como na publicação original na "Folha de São Paulo", em agosto de 1995, conferimos também os depoimentos de Bressane. Em "Belair, 20 anos depois", vemos uma reavaliação do que foi, nas palavras de Haroldo de Campos, o "terremoto clandestino" chamado Belair. Sganzerla fala da experiência da produtora carioca de vida efêmera que em apenas três meses (janeiro a março de 1970) conseguiu filmar seis longas-metragens. A sua posição em relação ao cinema brasileiro e aos seus cineastas permanece extremamente crítica: "O cineasta brasileiro não lê romances, não conhece dramaturgia, acredita mais nos seus próprios limites do que em qualquer janela para o mundo. É uma figura sisuda e melancólica". Para ele, na época da Belair "o fato de filmar já implicava uma resistência, empunhar uma câmera era um gesto heróico". Hoje, no cinema brasileiro "houve um enorme retrocesso, uma marcha a ré histórica brutal". Respondendo sobre a dicotomia cinema comercial x cinema de arte tão vigente no nosso cinema, Rogério evidentemente diz que ela é uma grande balela. Em seu cinema, essa separação nunca existiu. A relação de sua filmografia com a cultura popular de massa não reside apenas nos seus dois primeiros filmes "O Bandido da Luz Vermelha" e "A mulher de todos", os únicos que de fato foram sucessos de bilheteria. Até mesmo em seus filmes da Belair encontramos atuante essa preocupação. Em "Sem essa aranha" vemos a hábil articulação do humorista de TV Jorge Loredo interpretando o popular personagem Zé Bonitinho. Vemos Moreira da Silva e Luis Gonzaga. Rogério declarava fazer um cinema popular e de fato, de maneira original ele fazia.

"Cinema com arte: Sganzerla e Bressane" traz momentos antológicos como a parte em que Sganzerla e Bressane relembram a maneira como se conheceram. Os dois estavam no meio do Festival de Brasília de 1969, o primeiro, com "A mulher de todos" e o segundo, com "O anjo nasceu". Houve um choque, o principio de um processo de afinidade e admiração mútua que os levaram a criar a Belair. Os dois conversam sobre as suas visões do cinema, "o cinema é a expressão de um processo de pensamento", disse Bressane. Batendo um leve e descontraído papo entre si, os dois diretores nos oferecem uma agradável aula de cinema. Outra grande aula é realizada através de um outro bate papo: "Saganzerla e Renoldi: um encontro" por Luis Rocha Melo, André Franciolli e Alessandro Gamo. Sabiamente, a organizadora Roberta Canuto constatou que Rogério, como quase todo grande personagem, além de render ao responder perguntas realizadas por um repórter, também pode proporcionar grandes pérolas ao ser posto ao lado de um companheiro. Assim, junto ao seu montador e velho amigo Silvio Renoldi, Rogério Sganzerla manda ver.

Comprem o livro e divulguem.

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