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sexta-feira, 16 de novembro de 2007

O sertão visto por uma criança




Por Estevão Garcia

Entramos no universo ficcional proposto por "Mutum" (de Sandra Kogut,Brasil, 2006) através do olhar de seu pequeno protagonista Thiago (Thiago da Silva Marins). Tudo o que vemos, vemos pelo intermédio de seus olhos. Tudo o que compreendemos daquele contexto familiar e daquela ambiência, compreendemos através da percepção que o menino tem do mundo dos adultos. Aqui, a percepção do protagonista infantil se confunde com a do espectador. O que está nebuloso e pouco explicado para ele, também está para nós. Se o menino não consegue entender com precisão porque o seu querido tio teve sair de casa ou porque ele não se dá com o seu pai, igualmente não entendemos. E qual seria a relação de seu tio com a sua mãe, seriam eles amantes? Compartilhamos com Thiago a sua ignorância.

A câmera o capta com imenso carinho e ternura. Cabe ressaltar que, tanto Thiago da Silva Marins quanto os demais não-atores mirins, estão excelentes. Dirigidos pela preparadora de elenco Fátima Toledo, principal profissional da área no cinema brasileiro recente, as crianças são a grande força do filme. O carisma de Thiago somado ao direcionamento realizado pelo seu corpo e expressões é um dos elementos centrais de “Mutum”. O uso de seu olhar e de sua fisicalidade foram coordenados cuidadosamente. A sua colocação no foco principal da narrativa não sufoca e deixa espaço para o desenvolvimento sutil de outros olhares, principalmente os de seus irmãos.

Cuidado é a palavra-chave para definirmos a direção de Sandra Kogut em seu primeiro longa de ficção. Cuidado é um procedimento racional e nele estão embutidos pitadas de contenção, preocupação e cautela. A realizadora é extremamente preocupada na construção psicológica de seus personagens, não os quer fechados ou tipificados por conta de seu receio em cair no maniqueísmo. O sertão que Sandra quer retratar, inspirado em Guimarães Rosa, não flerta com o típico e com o catalogado. Não acaricia o exotismo, mas também não exagera em tintas naturalistas. A tragédia, ou melhor, o melodrama, é cautelosamente evitado. A morte de Felipe (Wallison Felipe Leal Barroso), situação melodramática por natureza, é arquitetada de maneira econômica. A emoção que "Mutum" constrói é sem grandes arroubos, não visa em fazer o espectador soluçar ou assoar o nariz. A estratégia de apertar o freio no melodrama não faz de "Mutum" um filme melhor ou pior, apenas se configura como mais um de uma série de receios da diretora. Esses receios sim limitam um filme que é feito mais a partir do que "não quer" do que "quer" ser. Podam o andamento, a fruição e interferem em seu resultado final.

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