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sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Flamengo até morrer de cirrose


Por Arnaldo Branco

Queria ter visto ontem "Irina Palm", o filme sobre uma velhinha (Cristo, a Marianne Faithfull) que masturba homens e mulheres por dinheiro, só porque já tinha um título pronto para a crítica: "Tocante" - mas o editor Zé José me convenceu a ver "O Engenho de Zé Lins" com um argumento definitivo: "toca o Hino do Flamengo três vezes". Mesmo sabendo que corria o risco de arrumar briga por me sentir tentado a levantar na poltrona com a mão espalmada no peito durante as execuções, fui assistir.
Apesar da enviada especial da Globo ao tapete vermelho do Festival afirmar categoricamente que documentário não é cinema (o que me fez pensar: pornô sem história é realmente pornô?), abri os trabalhos com essa sensacional produção de Vladimir Carvalho sobre José Lins do Rego, escritor associado aos canaviais, ao Flamengo e a questões de vestibular - maneira que nossos pedagogos inventaram para matar qualquer curiosidade dos jovens a respeito de autores de interesse.
Vladimir vai ao Engenho de Itapuá mostrar que o cenário fundamental do corpo da obra do escritor - que descrevia um mundo em decadência - já está em estágio de fossilização. Seu encontro com o ator Sávio Rolim, que fez o papel título em "Menino de engenho" de Walter Lima Jr. e agora em estado de demência, ajuda a sublinhar a idéia. O depoimento de Ariano Suassuna (que tem um momento de digressão genial sobre um cachorro que invadiu o palco de uma encenação de "Antígona") faz um paralelo entre o esquecimento do Engenho e a subvalorização da obra de Zé Lins pela crítica.
Os depoimentos, aliás, dão grande força ao documentário - além de Suassuna, familiares, Carlos Heitor Cony, Rachel de Queiróz - o poeta Thiago de Melo dá um testemunho extenso e detalhado sobre a agonia dos últimos dias de seu amigo; mas o que poderia ser um relato digno de uma tia velha em uma festa familiar entediante é temperado com espisódios de pura graça, como o do trote que o escritor o obrigou a passar em uma senhora.
Aliás, o tom do filme reflete o que dizem os entrevistados sobre a personalidade de José Lins do Rego - ora melancólico, ora esfuziante, como a parte sobre o fanatismo pelo Flamengo com cenas de arquivo do time em ação embaladas pelo Hino Sagrado. Resisti a levantar, mas cantei junto.
A sessão seguinte no Odeon seria a do filme "Nome próprio", baseado em livro de Clarah Averbuck, menina de nenhum engenho. Me fale sobre um mundo em decadência...

Texto publicado originalmente no dia 22 de setembro, durante a cobertura do Festival do Rio 2007.

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