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terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Os renegados de Jodorowsky


Por Estevão Garcia

Geralmente resulta ser irrelevante perguntar para um cineasta qual de seus filmes ele mais gosta e qual ele menos aprecia. Quase sempre nem é preciso perguntar. Jodorowsky por exemplo, nunca disse abertamente que odeia "Tusk" (França, 1980) e "O ladrão do arco-íris" (Inglaterra, 1990), mas afirma para quem quiser ouvir que não os considera como filmes seus. "Tusk" e "O ladrão do arco-íris" não são filmes autorais e, sim, projetos encomendados. Há uma indiferença e um rechaço em relação a esses dois filmes, que mesmo disfarçado, aflora nitidamente quando o diretor fala sobre a sua trajetória cinematográfica. Quem esteve no CCBB há alguns dias atrás para assistir à palestra de Jodorowsky sobre cinema, pode confirmar.

Jodo optou por falar de seus filmes um a um e, curiosamente, não começou pelo primeiro e, sim, pelo último. "O ladrão do arco-íris" mereceu ser o primeiro filme a ser comentado não porque o diretor o julga importante como obra ou como peça significativa dentro de sua filmografia e, sim, porque ele está inserido em um modo de produção que Jodo repudia. A experiência de filmar "O ladrão do arco-íris" foi valiosa porque, segundo Jodorowsky, o fez aprender de uma vez por todas que "no cinema industrial, a figura do diretor não vale nada". O que importa na indústria cinematográfica são as stars, porque são elas que arrecadam milhões. O cineasta deixou claro que trabalhou nesse filme sendo constantemente vigiado. Para modificar uma vírgula do roteiro ou para qualquer pequena alteração na mise-en-scène, era necessário pedir autorização ao produtor. Tão constrangedor quanto essa falta de liberdade de criação era o ego dos atores. Jodorowsky contou histórias onde a vaidade e a arrogância de astros como Omar Sharif eram tão imensas que mal caberiam em um elevador de hospital.

A leitura que esse relato nos sugere é que para o autor é melhor ficar sem filmar do que filmar dentro desse sistema de produção. Isso explica porque entre "La Montaña sagrada" e "Tusk" existe um intervalo de sete anos. Depois do relativo sucesso de "La Montaña Sagrada" no circuito underground europeu e norte-americano, o produtor Alan Klein lhe propõe a realização de um filme erótico. No inicio dos anos 70, houve uma significativa abertura para a exploração do erotismo, tanto no cinema comercial quanto no chamado "cinema de arte". O cinema erótico proliferou em diversas cinematografias e qualquer filme que de certo modo com ele flertava, era sinônimo de lucro garantido. Jodo, mesmo fazendo um cinema que se relaciona profundamente com o corpo e com a sexualidade, como podemos constatar claramente em "El Topo" e "La Montaña Sagrada", preferiu não entrar na jogada. Ele queria fazer um filme místico e não um filme erótico. O que ele poderia ter feito se tivesse aceitado o convite de Klein, era através do molde do gênero erótico acrescentar elementos pessoais. Poderia, como muitos autores que foram contratados pela indústria para fazer filmes de gênero, transgredir sutilmente os seus códigos e fórmulas. Um filme erótico-místico poderia ter surgido dali. Mas, Jodo preferiu não negociar.

Jodo bateu pé e só voltou para atrás das câmeras com "Tusk", sem dúvida o seu pior filme. Se "Tusk" e "O ladrão do arco-íris" são os filmes renegados de Jodorowsky, o primeiro, dentro desta categoria, consegue se sobressair. "Tusk" é o renegado dentro dos renegados. Esse filme é tão desconsiderado por Jodorowsy, que ele nem ao menos foi citado. Jodo, na sua palestra filme a filme, simplesmente o ignorou. Nem para servir de pretexto para falar mal da indústria "Tusk" serviu. Realmente, se em "O ladrão do arco-íris" podemos ver um Jodorowsky amestrado, algemado e contido, em "Tusk" não conseguimos detectar sequer algum traço do autor. Minto, forçando muito a barra, podemos dizer que há algo do universo jodorowskyano ali. Mas, sem forçar, a única coisa que a gente encontra dele em "Tusk" é seu nome nos créditos finais.

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