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terça-feira, 15 de abril de 2008

PhD em Cinema Brasileiro: O dia em que Bertolucci falou "eu amo o cinema brasileiro"


Por Paulo Henrique Souto

Ano 1978, eu trabalhava o lançamento de "A Lira do Delírio" (foto), de Walter Lima Jr., com enorme prazer, porque Waltinho, gentil-homem, me aplicou de Rio de Janeiro nas andanças pelas redações de jornais e rádios - naquele tempo íamos às redações - entregar as fotos, os lindos e caprichados press-books. Recém chegado de Minas, conheci os becos, os bons restaurantes da cidade, os bares maneiros, apresentados pelo diretor, um privilégio. No sábado anterior ao lançamento, Waltinho promoveu uma feijoada em sua casa no Cosme Velho, casa linda com quintal, vários cineastas em torno de Bertolucci que lá pelas tantas declarou que amava o nosso cinema "pela criatividade", que ficava muito impressionado como, sem grana, produzia-se lindos e bons filmes, inventando gruas, lentes, enfim, criando... e arrematou que "tinha vontade de fazer um filme assim, com pouca estrutura (leia-se grana)".

Na segunda-feira, na pré-estréia, no Cine Palácio, com forte aparato, luzes de enormes refletores na rua - alugadas da produtora de Jece Valadão - iluminando a porta do cinema, casa lotada. Muita coisa aconteceu naquela noite, um colega da Embrafilme veio correndo me avisar que os travestis que atuavam no filme foram barrados pela gerente do cinema, corri até lá e expliquei pra, acho que era dona Elza, que tinha que deixá-los entrar pois eram convidados de honra do diretor. O primeiro que entrou, voltou a cabeça de lado, mostrando a vasta cabeleira, e disse pra gerente: "Não falei que um dia ainda entrava neste cinema montada?" (vestido de mulher, pros leigos). Pedi ao pessoal da imprensa que aguardasse o final do filme, pois o Bertolucci daria uma declaração. Acabou o filme, lá ia ele saindo de fininho, o chamei, ligaram as luzes das TVs e fiz a proposta, de propósito: "Por favor, diga pra imprensa brasileira como você vê o nosso cinema, como disse na casa do Waltinho". E tudo o que ele tinha dito ficou ali registrado, e ainda um belo comentário sobre a "A Lira do Delírio". Aliás, ratificava tudo o que ele disse, um filme feito com pouca grana e supercriativo, como todo o cinema de Walter Lima Jr.

Ano 1994, Ana Maria Magalhães, querida amiga, estava em Brasília e levou uma cópia do seu filme "Erotique", recém finalizado, uma coletânea de filmes de mulheres com temas eróticos. O episódio da Ana, "Chamada final", é baseado num conto de Clarice Lispector. Bertolucci apareceu em Brasília, Ana assim como muitos outros cineastas brasileiros é amiga do italiano, e aí resolveu mostrar o filme pra ele numa sessão matinal que não atrapalhava o festival. Na entrada do Cine Brasília eu disse pro Bertolucci: "É a segunda sessão de cinema que promovemos para você, lembra-se da Lira?". E ele: "Claro"... Gustavo Dahl, que na época do lançamento da "Lira" era diretor da Embrafilme, deu uma senhora gargalhada encantado com a minha memória e cara-de-pau. Eu perguntei se ele ainda tinha a mesma opinião sobre o nosso cinema, claro que tive que relembrar o que ele havia dito, e ele respondeu: "Vou fazer um filme parecido agora, com a minha própria produtora, com orçamento menor, sem interferência de grandes majors. Anos depois, assistimos ao lindo "Assédio", claro que com uma senhora infra , mas realmente o filme tem um clima diferente.

Lembro de Bertolucci andando a pé do hotel até a Praça dos Três Poderes, falando que era louco para ver de perto a Brasília que já o emocionara nos cartões postais e nos filmes. Alma simples, de artista, tem este mago do cinema. E tive o prazer de vê-lo e revê-lo, e contar pra você que agora me lê. Viva o bom cinema brasileiro, que volte a ser exibido, que saia das prateleiras, pois cinema, do grego kinema, é movimento, foi feito pra rolar. E aguardem o próximo episódio...

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4 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Pessoal, vocês vão adorar o CineDica.

16 de abril de 2008 às 22:12  
Blogger Cris Valente disse...

Paulo Henrique, meu anjo, seu texto é uma delícia. Você, como nosso outro amigo Paulo, também nos deve um livro.
Beijos,
Cris Valente

17 de abril de 2008 às 18:47  
Blogger Cris Valente disse...

Paulo Henrique, meu anjo, seu texto é uma delícia. Você, como nosso outro amigo Paulo, também nos deve um livro.
Beijos,
Cris Valente

17 de abril de 2008 às 18:48  
Anonymous Anônimo disse...

Viva nosso Phd em Cinema Brasileiro. Haja blog para conter todas as histórias deliciosas que você tem pra contar. Que venham outras, para gáudio de seus fãs.

27 de abril de 2008 às 01:45  

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